“Aqui as pessoas nascem resilientes!” A frase não é minha, mas me chamou a atenção ainda mais no momento pelo qual passamos. Quem me disse isso foi a minha colega de turismo Marianne falando sobre o Vale do Jequitinhonha localizado na divisa dos estados de Minas Gerais e Bahia.

Esta região recebeu o apelido de “Vale da Miséria” nos anos 70 e até hoje normalmente aparece na mídia quando o assunto é pobreza ou falta de investimentos. Raramente as notícias veiculadas de lá são positivas.

Artesanato
Localização do Vale do Jequitinhonha (em vermelho)

Resolvi aproveitar este espaço para jogar uma luz diferente sobre a região e mostrar como o turismo faz parte desta conquista. A famosa “Cerâmica do Jequitinhonha” me surpreendeu não apenas pelo capricho, mas principalmente porque as peças contam uma historia. Vai muito além das tradicionais lembrancinhas e souvenirs de viagem.

É a história das mulheres de Campo Buriti, pequena comunidade rural do Vale. Tudo começou quando elas perceberam que unidas, teriam mais facilidade de vender o artesanato que produzem. Se organizaram, criaram uma associação (sem ajuda da prefeitura) e fizeram correr a notícia de que vendiam artesanatos de cerâmica.

No início basicamente a louça do dia a dia que depois evoluiu para a criação de jarros, vasos e peças decorativas. As peças são todas diferentes, mas são parte de uma forma de arte tradicional que é transmitida já há 5 gerações. Das bisavós às avós, mães e netas . Apenas mulheres ! Que continuam quando o dinheiro acaba, que recomeçam do zero diversas vezes. Resilientes

A imagem em destaque fala por si. Os noivos não aparecem porque não estão em Campo Buriti. Estão longe, na cidade grande trabalhando ou à procura de trabalho (que não existe na comunidade). Vidas separadas por uma questão de necessidade e sobrevivência que reflete na arte. Artesanato com alma, storytelling de verdade!

“O que a cerâmica significa para você?” Dona Faustina, líder da comunidade, responde que é terapia, renda e garante a independência das mulheres. E com a cerâmica elas foram mais longe. Virou temática de viagem, um motivo para ir até o Vale. As ceramistas viraram anfitriãs e recebem viajantes com interesse nas oficinas do artesanato local.

Do Barro à Arte resume muito bem a proposta da viagem. Você literalmente cria a sua lembrança de viagem, se hospeda na comunidade e é integrado nas atividades do dia a dia. Como por exemplo, colher o pequi (fruto típico do cerrado) que será servido com arroz , prato local típico. E o almoço com prosa pode durar 2h porque também é uma experiência.

A ideia central do turismo comunitário é inverter os papéis da atividade turística comum. Num passeio tradicional você leva como lembrança uma rede, uma cachaça ou algum artesanato local. Quem produz a lembrança possui papel de coadjuvante na logística do passeio.

O turismo comunitário faz a inversão, colocando a comunidade no centro da atividade. A população local, de forma associativa e solidária, participa diretamente das decisões e das atividades de turismo. E o Vale de Jequitinhonha é um ótimo exemplo que deu certo. Uma nova forma de pensar turismo.

Conhecer algo novo e de um jeito diferente sempre implica se despir de alguns preconceitos. Vale mencionar que sair da zona de conforto não significa passar perrengue, muito pelo contrário. Porque viajar significa descobrir.

Este texto estava previsto para ser publicado em março, mês da mulher. Fica então combinado que abril também será mês da mulher!

Foto: Noivas sem noivos (Viajar Verde)

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4 comentários
  1. Parabéns pelo lindo artigo!!!
    E Parabéns também para essas mulheres guerreiras que vão à luta!!!
    Através de artigos como esse, ficamos conhecendo coisas do nosso imenso Brasil!!!

  2. Muito bom ler coisa Boa sobre um lugar desconhecido. Um aplauso a essas mulheres fortes! E que saudade de comer pequi, que pude SaborEaR uma vez só, quandO criança. Se ainda der tempo, quero um dia poder abraçar uma dessas muLHeres! Obrigada pelO lindo artigo!

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