Quem mais amou a live do Caetano?

Eu falo muito da minha família “almodovariana’, cheia de mulheres intensas e sanguíneas. Mas acho que nunca contei que a música sempre foi uma constante na nossa casa. Talvez esse gosto musical tenha vindo do meu pai. Nada muito clássico, confesso. Acredito, talvez, que por ser um imigrante espanhol apaixonado pelo Brasil, ele era um verdadeiro amante da MPB.

Tenho memórias de fitas K7 tocando sem parar no carro: Elis Regina era habitué, e eu não entendia o porquê da devoção da minha minha mãe àquela mulher. Hoje entendo, principalmente quando Elis me faz chorar com ” Atrás da Porta”. 

Além de Elis (“É Pau É Pedra” deve ter furado o LP), Tom Jobim, Benito di Paula (quem aqui se lembra de ” Meu amigo Charlie Brown’?), Jair Rodrigues, Gilberto Gil, Wilson Simonal, Clara Nunes, Beth Carvalho, Tim Maia, Emílio Santiago, Originais do Samba, todos frequentavam a casa de Dona Sônia e Zé Luiz. E Gal Costa, com toda certeza. “Baby” tocava até enjoar. 

Claro que conforme os anos passavam, chegavam novos intérpretes. Vieram Djavan, Ivan Lins, os sambas-enredo das Escolas de Samba do Rio.

Roberto Carlos sempre foi o rei absoluto. “Detalhes” era a favorita do meu pai, um romântico incorrigível. Até pouco tempo atrás os discos ficavam expostos na sala, perto de um toca-discos modernoso. Preciso urgentemente procurar onde estão essas relíquias.

Já Caetano e Chico eram bissextos. “Alegria Alegria”, mesmo sendo de 1967, era um clássico na nossa casa musical. “Sampa” também, mas não me lembro de muitas música do Caetano sendo reprisadas na vitrola. Talvez porque o baiano estava no exílio, e meus pais não se conectaram muito com essa fase “Doces Bárbaros” dele. 

Mas aí cheguei na adolescência, no início dos anos 80, e me apaixonei.

“Outras Palavras”, “Rapte-me Camaleoa”, “Lua e Estrela”, “Eclipse Oculto”, sabia todas as letras de cor. Elas pautaram minha melancolia de menina inquieta, tocando nas Rádios Cidade da vida.

Tenho uma hors-concours:  “É Hoje”. 

Ahh, como amo:

“A minha alegria atravessou o mar, e ancorou na passarela, fez um desembarque fascinante no maior show da terra. Será que eu serei o dono dessa festa, um rei no meio dessa gente tão modesta…levei o meu samba pra mãe de santo rezar, contra o mau olhado carrego o meu patuá. Acredito! Acredito ser o mais valente nessa luta do rochedo com o mar, é hoje o dia da alegria, e a tristeza, nem pode pensar em chegar”

“É hoje” carregava promessas de um Carnaval na praia, no auge dos meus quinze anos, dançando de havaiana em bailinhos inocentes.Com a fantasia de encontrar o “príncipe encantado” vestido de pirata. Não me julguem: esperamos o “príncipe  encantado” sim, estava no nosso DNA de adolescentes dos anos 80.

Assistindo a live do Caetano ontem, me dei conta que ele faz parte da nossa história, que luxo. Nossos pais assistiram o III Festival de Música Popular Brasileira de 1967, na TV Record, onde Caetano cantou “Alegria Alegria” e Chico “Roda Viva”.

Quem tem em torno de cinquenta anos pegou o início do Tropicalismo e cresceu vendo um Caetano cabeludo, cheio de colares de miçangas e batas tie-dye. E se deparou ontem com um homem charmosérrimo de 78 anos, com uma voz densa e uma elegância deliciosa.

Falam dos 78 anos de Paul McCartney, de Mick Jagger e Keith Richards. Dos 70 e poucos de Elton John. Temos Caetano Emanuel Viana Teles Veloso. Muito mais cool.

E ouvir Caetano cantar “Você Não Me Ensinou a Te Querer” valeu por 2020. Revendo hoje a live pensei… Mesmo com essa pandemia, podemos achar algumas ilhas de alegria.

A live do Caetano foi uma. Uma verdadeira ilha de alegria em 2020.

Um beijo e até a próxima.

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13 comentários
  1. Clau ! É INCRÍVEL mesmO termos o caetano en nossas vidas ha tanto tempo !
    Fossas, carnavais , namoros , esperanças! Tudo junto e misTurado!! Muito bom seu texto !

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