Achei que a essa altura da minha vida já estaria com metade do trabalho resolvido, definido, como num jogo onde as casas percorridas são apagadas à medida que avançamos no tabuleiro. Minha vida profissional, minhas questões familiares, minha situação financeira, colocadas no fundo dessa sacolinha que eu convenientemente carregaria comigo por aí sem preocupações, acessíveis, mas não urgentes.

Eu sabia que gostaria de experimentar um novo amor, sabia querer adoçar minhas noites frias com algum carinho, uma boa conversa, oferecer ao meu corpo prazeres compartilhados. Só não podia imaginar a preguiça que sentiria depois da primeira tentativa. O desânimo e o cansaço que acompanham a superficialidade do processo da nova conquista.

Será que a chata sou eu, intolerante, presunçosa? Ando meio sem paciência para tudo o que foge ao meu controle, irritada com o desconhecido. Culpa talvez dos meus hormônios desregrados, sim, são eles os algozes que me forçam passar as noites com Netflix, chocolates e uma garrafa de vinho.

O que precisava agora, mais do que nunca, era encontrar diversão na liberdade da minha vida recém solteira e sem filhos. Degustar sem receios a reviravolta do meu roteiro e me deixar levar pela casualidade dos acontecimentos. Tudo fluiria bem a partir daí, diziam meus instintos esperançosos. “Ousar mais, ousar mais…”

Foi por isso que decidi, finalmente, me render ao apelo marqueteiro daquela empresa matchmaker focada em maturidade e colocar o meu nome em seu site. Aceitar esse empurrão. Nome, idade, gostos, fotos, hobbies, o curto questionário prometia entrelaçar os meus dados com outros vários potencialmente compatíveis. Detalhes de apenas uma parte do que realmente sou. Mas o perfil estava criado. Fácil como tudo o que é muito bom ou muito ruim.

E dessa vez longe de conselhos bem-intencionados. Faria tudo sozinha e sem alarde. Já tinha entendido que a via impessoal para esse tipo de arranjo era bem menos complicada, imparcial, mesmo que sujeita à tal subjetividade manipulativa da web.

A ajuda que muitos sentem que preciso é irreal, não sinto “falta” de estar num relacionamento ou “necessidade” de outra pessoa. Minha melhor companhia genuinamente sempre esteve do outro lado do espelho.

O que me intriga hoje é o desafio, a possibilidade de conhecer e saborear algo inusitado, trocar sedução numa única noite ou várias. A brincadeira. Como fiz no meu último encontro, tão deliciosamente perfeito e fugaz, sem ressentimentos ou arrependimentos.

Essa necessidade de tornar infinito os nossos amores nos arruína desde que começamos a ler Cinderela e suas irmãs. Nos empurrar injustamente contra expectativas irreais e inalcançáveis é tão burro quanto ficar esperando um milagre nos salvar do tédio dos padrões que aprendemos a cultuar. Demorei muito para entender essa dinâmica.

Quando enfim chegou a quarta-feira acertada, às vinte e trinta, entrei no restaurante combinado e não vi ninguém além de um rapazinho sentado no bar e dois casais conversando num canto. Levei um bolo, foi meu primeiro pensamento, checando no celular se haveria alguma mensagem da mediadora.

“Ele já está aí, será que você não entrou no lugar errado?” , ela escreveu, me achando uma idiota incapaz. Eu estava no lugar certo, pontualmente. E embora um pouco decepcionada, decidi aproveitar a minha noite ali, jantando sozinha.

Sentei e pedi uma bebida. A solitude da mesa vazia não me incomoda. Mas para a minha surpresa, um sorriso interrompeu meus pensamentos, o mesmo que me olhou confuso quando passei direto por ele, minutos atrás.

Vinha apressado na minha direção. Tão menino, tão absurdamente mais novo do que eu, alegre, confiante, despreocupado. “Você não me viu”, disse ele docemente, tudo o que saía da sua boca parecia doce, simples, fácil. “ É verdade”, eu menti, minha cabeça à mil, arquitetando como prosseguir com essa missão inesperada. Seria errado me sentir assim tão atraída?

Tínhamos muito pouco em comum. Não por causa dos anos que nos separavam, não era essa a questão, aconteceu, falávamos línguas diferentes. Mas inesperadamente isso não nos impediu de continuar sentados no mesmo lugar por horas, ouvindo as nossas histórias, opinando sobre os nossos mundos distintos, conectados estranhamente por uma ótima comunicação. Presentes.

E quanto mais o tempo passava, mais queríamos nos conhecer, instigados pela curiosidade do que estaria por vir. Livres da cobrança do compromisso, protegidos pela infinidade de “senãos” que desde o início desculparam qualquer tentativa de promessa. Apenas a vontade de esgotar todas as possibilidades dessa nossa troca, consumi-la, até acabar o assunto.

Eu não esperava, antecipava, coisa alguma. Nunca estive mais confortável. Dele, até então, queria só o terceiro encontro.

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