Quando falamos em deficiência, o que vem à mente? Qual sentimento lhe ocorre? Da minha experiência enquanto mulher com deficiência e mãe de uma criança com deficiência, posso dizer que essa palavra, em geral, evoca termos como dificuldade, falta, problema. Às vezes, vem junto também o defeito, o demônio. Noutras, vem a vulnerabilidade. E é esse conhecimento do senso comum que atravessa as pessoas com deficiência cotidianamente.

Imagina que sempre que somos recebidas, recebem uma falta, um dó, um desconforto. Um lembrete da fragilidade da existência que se tenta esconder a qualquer custo. Nossa presença não costuma ser desejada, muito menos confortável. Mas o que o senso comum entende como deficiência é só uma versão dos fatos. Uma versão que, há anos, lutamos para transpor.

Deficiência não é um laudo, um diagnóstico, uma característica que se carrega no corpo. Supor isso é o mesmo que imaginar que há um padrão de ser humano a ser perseguido, como se fôssemos mercadorias produzidas em uma fábrica, e aquelas que não passam no controle de qualidade vão para a sessão de pequenos defeitos, são descartadas. São pessoas!

Nossas diferenças são o que há de mais potente na nossa humanidade. São o que garante que a vida seja viável e sempre renovada. Deficiência, portanto, é o que se produz no encontro desse corpo que tem um impedimento com o mundo em que vivemos, que não acolhe a diversidade humana. Deficiência é uma situação de opressão.

O mundo é que precisa de conserto, de reparo, não as pessoas. As pessoas precisam de cuidado. É o cuidado que sustenta a vida, que tece essa rede de interdependência da qual todos somos um ponto, uma parte. Todos. Não há que se esperar que uma pessoa com deficiência supere sua condição e alcance a independência – essa palavra tão falaciosa quanto o grito do Ipiranga.

Há que se assumir nossa interdependência como princípio que organiza a vida. Há que se pensar o cuidado como um direito fundamental, como um modo de promover justiça social. É a partir desta compreensão que poderemos erguer uma trincheira para nos proteger da injustiça, da desigualdade, da invisibilidade e da morte.

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