Vale para todos os tipos de filha que você é. A que tem mãe e a que não tem. A que não a conheceu também. A que teve mãe, mas acha que não teve. A que nem quer ouvir falar no nome da mãe. A que ama e a que não.
A ideia de vestir roupas da mãe não veio da minha cabeça e sim da fotógrafa Karolina Jonderko. (Embora eu já tenha cansado de brincar disso na infância…) A artista é polonesa e a maioria dos seus projetos trata de consequências de perdas. “Self-portrait with my mother”, trabalho em andamento de Karolina, busca resgatar a história de sua mãe já falecida, por meio das roupas.
A mãe da premiada fotógrafa trabalhava em uma mina de carvão e nunca escolheu nem comprou roupas. Preferia economizar e aproveitar o dinheiro para outras despesas. E com o que ela se vestia? Com roupas de segunda-mão. A família recebia doações de parentes que moravam na Alemanha. Karoline lembra-se da alegria em ver a mãe recebendo pacotes com roupas e, para também frascos de geleia, e potes de creme de avelãs.
Para os autorretratos, Karolina traja as roupas que pertenceram à mãe . Atualmente estão armazenadas na casa da avó, que faleceu depois. Uma maneira amorosa de relacionar o passado e presente. O figurino é composto exatamente do jeito que a mãe usava, segundo as lembranças da artista.
Ao remexer no vestuário, um momento emocionante. Encontrou fios de cabelo da mãe em um casaco verde. Arrepia, não?
Que tal um outro momento pelas palavras dela? “Dia de sol, toda a família ficava sentada no jardim da minha avó, salsichas na grelha, pássaros cantando, risos, conversas. Nesse vestido, minha mãe estaria sempre sorrindo, relaxada. Ela fazia isso apenas em dias ensolarados, em dias de sem trabalho.”
Aí você vai me perguntar: mas e eu, que tenho “zero” ligação com a minha mãe? Penso que se você leu o texto até aqui é porque no mínimo tem curiosidade em recuperar algo do passado.
Investigar o guarda roupa da mãe pode trazer muitas revelações sobre ela e sobre “o seu tempo”. Que tecidos usava? Que cores predominavam? Ela podia escolher seus próprios trajes? Podia comprar? Como combinava as peças? As roupas são mesmo um mundo de memórias.
Fui vasculhar o guarda-roupa da minha mãe e, junto com ela, resgatamos boas histórias de algumas peças que ainda estão lá. (E em uso!) Encontrei um conjunto salmão com golas ornamentadas de sianinha branca que eu pedia para mamãe usar quando ela ia nas reuniões da minha escola. Achava aquela look muito “chique”.
Desembrulhamos um casaco gigante de pele que ela herdou da sogra nos anos 1960. A temperatura era tão baixa assim em São Paulo? Estranho ver minha mãe vestir-se de pêlos.
Rimos juntas ao encontrar uma blusa de cor vinho com “mangas morcego” que eu falava que ela parecia uma “bruxa”, pensando que era elogio. Muitos vestidos ainda no cabide foram confeccionados por dona Angélica, uma costureira simpática e criativa. Mamãe também lembrou de algumas roupas -doadas há muito tempo- que ela mesma costurou com a minha avó utilizando tecidos de cortina, doados pelo tapeceiro.
Quantos detalhes que enriqueceram meu vocabulário. Cós, “debrum”, helanca, elastex, ilhós, pesponto, gorgurão, pence, casinha de abelha, plissado, nesgas, pala, godê, evasê, alinhavo, chuleio, cavalo, jabô, drapeado. Aqui não vai caber tudo!
Feito o regate de roupas que levou uma tarde de domingo, agora estamos planejando as fotos para eternizar esses momentos. Mas, ao contrário da artista Karolina, faremos nós duas. Que sorte!
Jeito gostoso de comemorar esse Dia das Mães.
Feliz dia de todas as mães.
4 comentários
Texto belíssimo! Ainda Me vejo muito em minhas memórias lá no guarda-roupa de minha mãe; recordações afetivas das primeiras formas, cheiros, aquela ideia de vestir o seu primeiro modelo, sim, mãe é sempre a nossa primeira referência.
Maísa: delicia de texto. Minha mae Já partiu para um lugar onde com certeza segue com suas CRIAÇÕES maravilhosas em CROCHÊ e deve estar vestida con a ELEGÂNCIA de seMpre, con suas echarpes . Herdei Dela o gosto por criar roupas e inventar estilos muito Próprios ao nosso jeito sulista de vestir. Ainda hoje nao so guardo como uso alguNs acessorios dela e isso me deixa muito orgulhosa dela .
Maisa, delicia ler isso! Minha mae era costureira e todos esses termos faziam parte do nosso dia a dia. Lembro muito de ir ate uma casa avarandada no largo do arouche (moravamos ali do lado) levar botoes para serem forrados com o tecido do vestido ao qual seriam pregados. Um luxo!
OBRIGADA, THEA!