Um trecho de Nietzsche me socou outro dia (do livro “A Gaia da Ciência”.) Estou sangrando há semanas, e tenho falta de ar toda vez que penso no que li. Na maior parte do tempo, tenho certeza de que tudo o que já vivi me fez quem sou, mas quando revisito aquele demônio nietzschiano provocador que sussurra em meus ouvidos com desaforo, duvido do valor das minhas experiências.
Ele me pergunta como seria minha reação se eu tivesse que viver novamente esta mesma vida, repetindo tudo exatamente como se deu. Escolhas, momentos, decepções, fantasia, sonhos, coragem e covardias. Será que eu concordaria? Com desespero ou alegria?
Talvez você ainda não tenha muito com o que se preocupar ou se arrepender, mas todo mundo que vive, estou falando de vida e não de sobrevivência, todo mundo que vive vai precisar responder as essas perguntas pra si mesmo em algum momento.
Confesso que vacilo na resposta e ando com medo do meu próprio julgamento. É que eu tenho tentado extrair um litro de limonada de limões já passados do ponto, experiências que caducaram em um canto da casa em penumbra. E esse negócio de ressuscitar o passado ainda vai me levar à bancarrota emocional.
Quando me perguntam o que eu aprendi neste ano, que por ainda não ter terminado pode vir a me ensinar um bocado, tudo o que me ocorre é: faça planos, mas não confie neles. Não confie nos serviços postais, nos pacotes de viagem, nos currículos enviados por e-mail com resposta automática, não confie no efeito dos remédios genéricos, nas pessoas que não gostam de cachorro, não confie nas palavras ditas durante o café da manhã e bem menos nas palavras ditas quando se está com fome.
Faça planos, mas não confie que terá tempo de sobra para dizer o que se quer dizer, que haverá sempre outra ocasião para fazer o que se quer fazer. Não confie nos relógios de parede que sempre atrasam – provavelmente por algum motivo de ordem mecânica que eu ignoro -, não confie no despertador do celular, nos testes de gravidez de farmácia, nas previsões dos economistas, e, principalmente, não confie em cartas de amor que não são bregas.
1 comentário
Sem dúvida é uma pergunta inquietante. O texto me fez refletir sobre muitas coisas e o estilo de escrever da Lorena é uma delícia. Poético.
Adorei!