Rendas, veludo, tule, tecidos macios e com alta tecnologia, cores que se rendem ao feminino, combinando beleza, conforto e sensualidade – não necessariamente nessa ordem, povoam não só o desejo das mulheres em ter calcinhas, sutiãs, corpetes, entre outras peças maravilhosas e com identidade, como também as cabeças de quem vive de e para a criação da chamada moda íntima. Não há limites para criatividade e tampouco para quem deseja vestir uma peça linda, que destaca exatamente o que se quer usar.
Felizmente o leque de opções a todos os gostos e bolsos nessa área da moda é imensa e, no Brasil, a indústria voltada a roupas íntimas cresce, ganha novidades e nichos a cada estação e para todas as gerações. Tanto assim que o país é considerado o quinto maior produtor do mundo dentro da indústria têxtil, em um mercado dominado pela produção da China e de Hong Kong, que têm 50% de tudo que é produzido mundialmente, seguidos pela Índia, Estados Unidos e Paquistão, conforme dados do Relatório Setorial da Indústria Têxtil Brasileira em sua 13ª edição, divulgado pelo Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).
Esses números indicam que eis aí um promissor mercado que, embora abrigue gigantes como a Hope e a Victoria’s Secret, também aplaude a marcas que nascem da teimosia, da criatividade e da ousadia de quem começa a produzir em casa as primeiras unidades à moda íntima, como a entrevistada desta matéria, a empresária Priscila Gomide.
É nesse universo de marcas, cores e texturas que minhas amigas dos tempos de colégio procuram mais conforto na hora de decidir por uma modelagem de calcinha, sem abandonar os detalhes delicados. Ao mesmo tempo, marcas grandes e pequenas estão de olho nos desejos das consumidoras e há uma corrida para atender às exigências das mulheres – sejam elas quarentonas, cinquentonas ou 60+.
Quando pensei em fazer essa pauta, sondei algumas amigas a respeito do tema e também homens. Eles, à exceção do meu marido que elege sempre a renda para me presentear, não deram retorno. Queria saber o que usam e o que pensam. Uma amiga me respondeu enviando um vídeo da Fernanda Abreu cantando Kátia Flávia, a Godiva do Irajá. A resposta me levou a diferentes conclusões que, de fato, não deixavam de ser interessantes se a ideia fosse escrever sobre tipos de calcinhas em letras de música ou contar a história da da ex-miss Febem que abriu as portas para rodar o primeiro rap nas FMs brasileiras, lá nos anos 1980. Então, sem desprezar essa resposta, fui atrás de outras amigas.
Conversei com Rosiane Dalmagro, professora que este ano chegou aos 50 anos e decidiu, além de colocar box braids (aquelas tranças estilo africano) fazer um ensaio sensual em um estúdio profissional. Ela me contou que há muito tempo abandonou os modelos fio dental e virou uma adepta das calcinhas confortáveis com cintura alta, porém cavadas.
Detalhe: compra sempre conjuntos na cor preta, pois não gosta de vestir calcinha e sutiã ou top de cores diferentes. “O preto facilita muito”, diz minha amiga que não se importa de usar sempre a mesma cor, variando no tipo de tecido e detalhes. “Estou em uma fase da vida que priorizo o conforto e isso se aplica a várias coisas. Rendas pouco existem na minha vida. Conforto é a palavra de ordem. E o marido que lute! “, afirma Rosiane.
Ah, as alérgicas e as rendas! Sim, elas sofrem, pois por mais que tenham as gavetas lotadas de calcinhas coloridas e divertidas, se privam de usar as rendadas por conta de terem a pele sensível, especialmente nas virilhas. Esse foi, por muito tempo, um problema para a Ana Rodrigues, do perfil Diário de um Closet – que já publicou textos como “O mito da calcinha nova“, entre outros. Mas, nem tudo é para sempre. Por recomendação da dermatologista, ela fez depilação a laser e liquidou com a tal alergia. Um a zero para as calcinhas de renda. A dica da Ana Rodrigues é para as da marca Loungerie.
Mas se alguém está pensando que ao decidir pelo conforto as mulheres estariam abrindo mão da delicadeza e da beleza, como se estivessem revisitando os tempos das calçolas, está completamente enganado. Nas gavetas das amigas com quem conversei, entram short-dolls, bermudinhas shape, calcinhas com cintura alta e super alta, tops e bodies. Ganham espaço em uma segunda gavetinha ou cabides as anáguas (elas mesmas) tão apreciadas por nossas mães e avós, só que resignificadas e com papel de protagonizarem a complementação de looks diários e também os mais sofisticados.
Isso, aliás, me faz lembrar o look do ensaio P&B de Nicole Kidman que, quando estava com seus 4.8 posou para a revista Interview com um vestido que deixava à mostra o que a empresária Priscila Gomide, proprietária da Intensify Me batizou de middleware (já falo sobre esse novo conceito logo a seguir).
E que moda!
O mundo das lingeries é tão vasto quanto as mais ousadas fantasias que todas nós podemos ter ao comprar uma ou meia dúzia de peças íntimas. E não me digam que nunca tiveram um pensamento erótico na hora de comprar ou vestir uma uma calcinha ou body porque isso é tão saudável quanto desejar uma taça @de vinho e beijo na boca.
Não fosse tão natural assim, hoje não teríamos inovações na indústria que vão desde o desenvolvimento de tecidos para atender modelagens e acompanhar as tendências de mercado – apontadas por pesquisas e não pelo achômetro, indo à dedicação de estilistas e designers de moda que primam para colocar nas vitrines peças renovadas em todas as estações. Tem outro aspecto interessante: se até pouco tempo todas as peças eram chamadas de lingerie ou roupa debaixo, agora o nome correto é moda íntima. E que moda!
Revisitar peças que vão do queridinho fio dental às anáguas, valorizando os corpos de todas as idades, não é uma tarefa fácil a quem busca inspiração na história da moda, nas informações familiares e, inclusive, num bom bate papo com as clientes e está atenta às necessidades de quem não dispõe de recursos para comprar uma única calcinha (sim, uma única, acredite).
@Seguindo essa trilha, atenta ao que pode chegar às nossas gavetas, o que a indústria e o mercado da moda íntima apontam, conversei com a empresária Priscila Gomide, criadora da Intensify Me, com sede em São Paulo, sobre as preferências das brasileiras e as tendências. Não só fiquei surpresa com as novidades da marca como extremamente otimista com um trabalho que ela desenvolve e que permite a mulheres sem teto, as moradoras de rua, receberem doações de calcinhas (leia box abaixo).
Conhecer nosso corpo, nossos desejos, é fundamental até na hora de decidir o que vestir por baixo do jeans ou daquele vestido de linho. Podemos ficar mais poderosas com esse autoconhecimento e, porque não, com autoerotismo. Priscila Gomide pensou justamente sobre isso ao criar as peças da marca, especialmente uma das linhas.
Ela conta que certa vez, ao dar sugestões a uma cliente, recebeu como resposta que não haveria uma segunda pessoa a admirar a peça que a moça experimentava. Isso, contudo, não intimidou nem a cliente e tampouco a empresária, que apostou em uma linha que enfatiza o autoerotismo, que tem calcinhas de franjas, sem fundo, acessórios de amarração, enfim o que se possa imaginar para fazer parte de um ou de vários momentos.
O passeio pela coleção da jovem empresária só me fez perceber que estou de volta à vida, depois de dois sofridos anos de depressão no qual pensar em me presentear com uma lingerie estava totalmente fora de cogitação. Sim, as pessoas passam por momentos nos quais viver é tão sofrido que é perfeitamente compreensível dispensarem um olhar amoroso sobre si mesmas à frente do espelho.Escolher um body ou uma calcinha rendada pode ser, sim, um sinal de que as coisas estão melhores. Faz bem experimentar e comprar peças de moda íntima. Tão bem quanto fazer um curso, fazer um jantar a velas para seu companheiro ou companheira. Se te deixa bem, faz bem.
Parem tudo, as novas anáguas chegaram
A conversa com Priscila me rendeu este texto e uma reflexão sobre o que pode ser considerado frivolidade por alguém é, ao mesmo tempo, o start para uma volta à vida. Além disso, buscar dados sobre o que representa esse mercado da moda íntima feito por centenas brasileiras. É preciso, sim, pensar sobre esse viés que vem no bojo de cada sutiã ou na renda das anáguas.
Foi com esse olhar que prestei atenção nos detalhes da Panty Musa. Segundo Priscila Gomide, os modelitos desta linha são super procurados por mulheres que de maneira alguma dispensam a beleza e suavidade nos tecidos, mas apreciam muito o conforto. A empresária fez um roteiro interessante até chegar ao atual catálogo. O que me chamou atenção e me deixou curiosa foi a volta das poderosas anáguas, com designs ousados. Minha desconfiança se confirmou: Priscila queria peças à francesa, que caíssem suavemente nas curvas femininas e dessem total conforto às consumidoras.
“Com sete pessoas trabalhando dentro de casa e a contratação de mão-de-obra fora, cada vez mais pensava em um resultado com arte e tingimento natural, com combinações para aparecer nas transparências. Vendemos muito bem no atacado estas lingeries e aí passamos a ter um mercado muito mais delicado, ao estilo francês, bem como nossos avós usavam”, conta a empresária.
Assim nasceu uma linha que não é nem lingerie e tampouco roupa: a middleware, termo patenteado por Priscila Gomide, como todos os demais da marca. Do batismo a ganhar a preferência das mulheres paulistanas foi um salto e hoje as consumidoras estão nos principais centros do país, uma vez que além da loja física em São Paulo, todos os lançamentos de todas as coleções estão no site da marca.
Como comentei lá no começo da matéria, há muita renda, fitas, franjas, veludos, cores, sensualidade e conforto da moda íntima brasileira. Animem-se, meninas! Sempre é bom renovar a gaveta das calcinhas. Inspirem-se que a primavera e o verão logo vão bater à porta e, com ou sem pandemia, vivemos num país onde temos liberdade para ousar nas transparências e usarmos todas as texturas e modelos que tenham a ver com nossa personalidade.
BOX
Projeto de Gomide leva calcinhas às moradoras de rua
Um parágrafo seria pouco para contar como brotou o projeto social Eu te respeito, criado para dar a mulheres sem teto algo básico mas que a absoluta maioria delas enfrenta imensa dificuldade para adquirir: uma calcinha. É compreensível, pois entre comprar uma calcinha e comida, obviamente decidem pela segunda opção. Não há, para quem tem a rua como casa, ter peças íntimas em bom estado. Onde lavar? Como secar? Determinada a criar algo que ajudasse a dar o mínimo de dignidade a essas mulheres, Priscila Gomide deu início ao projeto que funciona da seguinte forma: a cada sutiã de amamentação comprado na Intensify Me é oferecido à consumidora a possibilidade de doar uma calcinha tecnológica (que seca em segundos porque é feita com tecido especial). A resposta das clientes tem sido positiva e as calcinhas tecnológicas já são distribuídas por meio de ONGs e a empresária pensa em expandir o projeto.
8 comentários
Parabbyéns, Deva, pela bela matéria. Mais do que vestir para moda íntima para agradar a outra pessoa, merecemos dar este presente e prazer a nós mesmas.Interessante também o projeto voltado para mulheres em situação de rua. Para quem doa cestas básicas, é legal incluir calcinhas e absorventes, pois elas não têm condições de comprar.
Muito importante essa abordagem. Adorei!!…realmente não ha limites para criatividade, as peças são tão lindas que da vontade de ter uma de cada. Quanta levesa elegância!!!
Que delicia ler sobre calcinhas e outras e novas modas. Adorei! E bom saber que tem inovando na área e pensando também em quem está nas ruas.
Obrigada, Marita. Sim, a proposta da empresária Priscila para reduzir o desalento das moradoras de rua é muito bacana. Que bom ver você aqui no Inconformidades.
Adorei o texto! Abordou tantas questões de forma delicada, informativa, em texto muito rico. Cheio de detalhes, como as rendas e os segredos que guardamos por baixo das calças, saias e vestidos… e só revelamos a quem queremos. A volta das poderosas anáguas me marcou!!
Obrigada, Cristiane. A volta das anáguas é mesmo uma excelente novidade. Obrigada por acompanhar nossa coluna .
Muito legal as duas proposta da minha xará: das calcinhas maiores e sensuais, e principalmente, o das moradoras de rua! Eu detesto calcinha fio dental, todo conjuntinho de lingerie que compro vem com uma e elas ficam todas em uma sacola na gaveta. Paradas!
Gracias, Priscila. Sim, a preocupação da sua xará com mulheres moradoras de rua é um exemplo a ser seguido. Vamos doar calcinhas a elas. Obrigada por ler a coluna .