Sempre fui do tipo bicho-grilo, natureba e adentrei para a maturidade desencanada de alguns cuidados estéticos. Não que eu estivesse satisfeita com o meu corpo ou com o rosto, tinha muita coisa que gostaria de melhorar. Mas, por algum motivo, eu não levava esse projeto adiante. Muito provavelmente, a minha rebeldia leonina.

No ano passado resolvi pegar o touro à unha, depois de concluir que precisava me apresentar melhor para as pessoas que consumiam meu conteúdo no Instagram, e dei início a um programa de autocuidado. Comecei com uma consultoria de imagem, que ganhei de presente de aniversário das minhas filhas, e emendei com uma dieta supervisionada por ortomolecular e nutricionista, além de incrementar meu programa de atividade física.

Emagreci sensivelmente, coisa que ainda estou fazendo, e, em dezembro, percebi que o rosto despencou. Gordinha, até que dava para encarar as várias rugas, mas, com o emagrecimento, fiquei com uma aparência acabada e entristecida.

Procurei uma dermatologista que eu já conhecia e encarei a empreitada: toxina botulínica, preenchimento com ácido hialurônico, laser e skincare diário, coisa que eu nunca havia feito. Exatamente isso, eu não usava sequer um creme hidratante no rosto!

Logo no primeiro exame físico minucioso, ela detectou umas pequenas verrugas a serem cauterizadas e uma pinta que deveria ser retirada. Decidi que seria em uma outra sessão. E assim foi, empurrei o procedimento até maio, quando fui para a revisão final, e ela já estava preparada. “Hoje você não me escapa, vamos retirar essa pinta no abdômen.” No flanco esquerdo, mais especificamente. Uma titica que eu nem percebia, com os peitos grandes que tenho.

Ela tirou, enviou para análise em um laboratório e agendamos retorno para retirada dos pontos em oito dias. No retorno, que seria para uma sessão de fotos comparativas, ela me apresentou o resultado do exame.

“Gisele, no resultado da biópsia deu um melanoma, provavelmente do tipo extensivo superficial, de tamanho pequeno.” Meu primeiro pensamento foi: trocaram o exame; isso não é meu. Conferi, li atentamente e chorei. Não só chorei, mas me desesperei. Daquele jeito de soluçar, pensar um monte de desfechos ruins e chorar convulsivamente.

Ela me abraçou, ofereceu água e um café e, só depois de me acalmar e certificar-se de que eu estava bem, me liberou para ir para casa. Antes, conversamos sobre a necessidade de procurar um especialista para uma nova abordagem cirúrgica, pois margens maiores de pele precisariam ser retiradas.

Em casa, ela me enviou os contatos dos médicos e no final da tarde eu já estava com a consulta marcada para o dia seguinte, em São Paulo (eu moro em Sorocaba, a 90 Km). O oncologista pediu para fazer uma revisão da biópsia com um especialista em melanoma e, uma semana depois, o resultado foi confirmado, apontando uma espessura um pouquinho maior da lesão: 0,3mm.

Tudo indicava que era uma lesão circunscrita e que seria resolvida logo mas, embora remoto, havia o risco de que células malignas vizinhas migrassem para outros órgãos. Foram dias confusos, em que eu sentia muito medo e era tomada pelos pensamentos ruins no pior cenário, alternando com tristeza e sopros de certeza de que tudo ia dar certo.

Como em um redemoinho, eu tentei me manter com a cabeça fora da água, sabendo que precisava estar alerta, pois a depressão que eu havia resolvido em 2008 poderia voltar. Era uma oportunidade e tanto…

Eu me agarrei a isso e decidi resolver tudo muito rapidamente. Sabendo da gravidade do diagnóstico, no meio de tudo isso eu me mantive focada em me cuidar, e segui firme no trabalho o que, junto de um companheiro perfeito e filhas muito acolhedoras e atentas, acabou sendo a minha bóia de salvação.

Como disse uma grande amiga, o entorno é o nosso suporte. Se ele for bom, a gente enfrenta as tempestades sem tantos estragos. Fiz uma pequena cirurgia em duas semanas, para retirar as margens da lesão e, na semana seguinte, no retorno com oncologista para tirar dois pontos intermediários, o resultado da biópsia estava na mesa: margens da lesão livres, sem mais nenhuma alteração.

Como a disseminação do melanoma (metástases) é pelo sangue e sistema linfático, temos que monitorar por 2 anos, fazendo USG a cada 6 meses, e vigiar qualquer sinal clínico diferente. Tosse persistente, dores, caroços, tenho que estar atenta a qualquer mudança.

Decidimos que vamos evitar exames com irradiação, pois há um risco significativo para leucemias. Aceitar isso foi bem complicado no começo. Na minha cabeça de enfermeira, já deveria fazer um escaneamento geral e resolver tudo logo.

Mas entendo que isso tem alto risco e que, na minha situação, tudo pode ser monitorado de forma menos agressiva e mais protetora. Recentemente fiz a retirada dos pontos que restavam e os exames, que a princípio, estão normais.

E decidi entrar em uma loja de roupas esportivas com proteção contra raios UV. Saí de lá com um chapéu, camisetas e um par de luvas, que usarei a partir de agora em minhas caminhadas diárias.

Nunca fui muito de lagartear sob o sol, mas tive toda uma vida de praia e piscina quase sem protetor solar, com muitas horas na água ou sob o guarda sol. E na juventude, em uma cidade muito quente do interior, usei bronzeadores caseiros por anos seguidos. À época, a regra era, quanto mais bronzeada melhor.

E, em dias frios, sempre gostei de esquentar ao sol até que as bochechas ficassem vermelhas e me desse vontade de tirar o agasalho. Pensei nisso no momento em que o médico me lembrou que “o bronzeamento é uma resposta da pele à agressão provocada pelos raios solares”.

No caminho para casa, considerei que essa rebeldia adolescente me custou caro e que o autocuidado, com todas as suas nuances de vaidade e travestido de um novo projeto de trabalho, me salvou: se eu não tivesse decidido fazer um tratamento estético esse câncer ainda estaria aqui, crescendo e se espalhando.

Cheguei em casa e me sentei no computador para escrever esse texto.
Esse artigo foge totalmente à minha proposta temática aqui no blog, mas não há um outro lugar em que eu queira ver publicada a história dessa minha dor.

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3 comentários
  1. Acabei agora de ler o texto. VONTADE de te dar um grande ABRAÇO e dizer com toda fé do mundo que tudo ficará bem ? Torço muito por você!

  2. E como eu Entendo bem o que passou! Sabe que tive câncer de mama em 2008, aos 48, recém Separada do Meu ex-marido. Como a vida brinca coNosco: se você nao tivesse a vaidade, quem sabe o que teria acontecido, verdade? E, existe lugar mais AconchegAnte Para desabafar, do que aqui? NÃo há!

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