Desde que eu fiquei “mocinha”, eu me preocupava em amarrar uma blusa na cintura para sair de casa. Esta improvisação no figurino tinha a função de garantir mais segurança nos dias de menstruação – quem nunca pediu para a amiga conferir se o absorvente não estava marcando na calça- ou ainda dar aquela amenizada no bundão e chamar menos a atenção.

Costumava seguir todas as listas de certo e errado de looks das revistas. Aliás, aquilo era um atestado de preconceito e militância de moda, concorda? Tão absurdo colocar as pessoas em julgamento que as fotos ocultavam os rostos. Seria como criticar -pelas costas- as escolhas das pessoas e ditar regras, sem levar em conta, estilos, personalidade, corpo e até mesmo o bolso.

Eu era uma leitora, vítima dessa inquisição e procurava seguir todos mandamentos. Já pensou, sair na revista uma foto minha com um “x” me acusando de errada?

Certa vez, em uma das sessões, o tema era ” capô de fusca – não cometa essa gafe”. Foi a primeira vez que li isso. “Capô de fusca ” ou também “pata de camelo” são expressões criadas para chamar o vinco das partes íntimas femininas que teima em aparecer na roupa.

“E agora? Como vou evitar que meu capô de fusca apareça? “. Além de continuar a esconder a comissão de trás, passei a cobrir o meu capô de fusca. Usava minhas próprias técnicas: blusa mais longa, calça mais larga, e tecidos menos marcantes.

Com as roupas de ginástica e de praia, era mais complicado. O capô de fusca parecia estar na linha de frente nas minhas caminhadas e aulas na academia. As extremistas, ainda davam dicas: “use cartolina ou absorvente”. Ou então “compre uma calcinha com enchimento. Assim não marca”.

Hoje seria mais fácil. Pasme! Há tutoriais na internet com dicas de como levar o seu de capô de fusca para passear. E tem coisa pior: há galerias de fotos de celebridades julgadas por exibirem tamanho descuido.

Estou com quase 53 anos e tenho abastecido meus pensamentos com literaturas feministas e flertado muito com o empoderamento. As mulheres não querem mais os aros, os bojos e até estão deixando os sutiãs. Aumentou o número de mulheres deixando os brancos aparecerem.
Quer dizer, a máxima é: somos mulheres livres para decidir o que queremos ou não mostrar.

No sábado passado, quando fui ao parque, comecei a caminhada e me dei conta de que havia esquecido no carro “a blusa de amarrar”. A ideia era voltar e pegar. Mas, pensei bem e disse pra mim mesma: “Chega de esconder o capô de fusca! . E fiz a caminhada livre, leve e solta de todas as amarras.

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5 comentários
  1. Belo texto, Maisa.
    Temos a mesma idade, essas seções de “certo e errado” sempre me chamaram muito a atenção, nem sei direito o motivo..
    Seu texto me trouxe luz para o dilema que tenho sentido atualmente, pois tenho acompanhado o dia a dia da filha de 16 anos. . .

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