Sempre gostei dessas brincadeiras em que escrevemos cartas para nós mesmas e lemos no futuro. Pensava em como seria a minha, e nas reações que eu teria ao lê-las. Como boa sonhadora, e uma leitora voraz, criava cenários e paisagens para o momento em que a carta seria aberta. Sorrisos, afeto, emoção, aquela doce e gostosa sensação de ver os sonhos realizados.

Eu, porém, nunca escrevi a tal carta.

Aos 46 faço escolhas para viver o meu amanhã de maneira mais consciente, mais saudável e, principalmente, mais feliz. Eu envelheci, seguirei envelhecendo. E tenho muito mais energia e alegria de viver do que aquela que estaria lendo minha carta. O preço deste caminho foi alto, mas eu não o trocaria pela vida que imaginava para mim lá atrás. Minhas escolhas foram se tornando, quase sempre, sábias.

Sabedoria, inclusive, foi uma das coisas que mais adquiri com a idade. Passados 21 anos de tantos planos perfeitos que fiz, se tem algo que posso afirmar que minha vida não é? Perfeitinha. Para isso, ao menos, não há regra etária!

Traçando um paralelo honesto, entre as expectativas que tinha e o que atingi, me sinto uma mulher vencedora. Tenho consciência, porém, de que muitas das pessoas com quem convivi, durante adolescência e juventude, consideram o oposto. Aos olhos de boa parte da nossa sociedade, que vê a idade como algo solitário, triste, feio ou infeliz, sou uma fracassada. Uma mulher que escolheu errado ao longo de toda a vida.

Afinal, sou uma mulher que chega na maturidade sem filhos, sem um legado concreto, sem um homem ao lado, sem carteira assinada ou sem uma grande empresa como sobrenome. Para o mundo, que vitória é essa?

Envelhecer não é visto como vitória, liberdade ou conquista. Envelhecer é algo que normalmente não é vendido de maneira positiva. Vivemos em um mundo que ainda não entendeu o potencial da nossa geração. Envelhecer mulher, feliz, e fora dos padrões? Isso é quase inadmissível.

Talvez aos 20 eu não imaginasse o quanto seria mais feliz, segura e plena perto dos 50. E, provavelmente, se abrisse uma carta de mim mesma hoje, perceberia o quanto a maioria dos meus sonhos e desejos não eram meus. Eu sonhei com aquilo que a sociedade me ensinou que era importante, desejei a perfeição de uma vidinha certa, sem dúvidas e sem medos. E que sorte a minha não ter vivido aqueles sonhos que não eram meus.

A mesma sociedade que torce o nariz para as escolhas que fiz, é essa sociedade que insiste em ignorar o quanto uma mulher adulta e madura tem para acrescentar ao mundo. É, também, em meio a ela que começamos a ouvir vozes buscando por mudanças e limites contra o preconceito. Combatendo o etarismo.

Mulheres que despontam com este mesmo tipo de indignação, surpresa, preocupação. Mulheres que se sentem melhores e mais interessantes depois dos 45. Mulheres que querem encerrar este preconceito arraigado a nossos costumes e cultura.

Afinal, em 2021 eu já não deveria precisar repetir, à exaustão, que decidi não ter filhos, apesar de ainda ser bastante fértil. E que também decidi que um casamento convencional apenas não se encaixa nos meus projetos de vida. Qual a razão de mulheres da nossa idade precisarem gritar ao mundo o quanto estão felizes com sua solitude? Ou o quanto são felizes com sua vida, seja ela como for? Qual a razão de precisarmos explicar que estamos bem?

Há zero sentido em ainda precisarmos nos esforçar tanto para nos provarmos, de darmos satisfações sobre o obvio, de ouvirmos piadas sobre nossa idade, cabelos brancos, rugas e corpos. Somos um número muito representativo de mulheres, e merecemos não apenas respeito, merecemos mais espaço também.

Traduzindo em números, em 2020 as mulheres com mais de 37 anos representavam 51% da população total do Estado de São Paulo. Só no Hospital Albert Einstein, a taxa de crescimento das maternidades acima dos 45 anos foi de 112%, em 5 anos. Segundo ainda, estudo da FGV, 10,53% da população brasileira têm 65 anos ou mais com crescimento de 20% comparado a 2012.

Envelhecer deve ser o melhor momento de nossas vidas. A maturidade deve ser premiada. Nossa sabedoria e potência, merecem reconhecimento. E eu sonho com o momento em que seja assim. Lutemos por isso.

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1 comentário
  1. Que texto incrível e tão autêntico! Envelhecer faz parte da vida. Hoje, aos 32 me sinto muito melhor do que aos 18. Amadurecimento, bagagem de vida, frustrações, conquistas e descobertas e sei que ainda tenho muito a desbravar.

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