É mais fácil conseguir que um ministro confesse um caso de corrupção do que arrancar de um amigo a frase “estou na andropausa”.        

Nestes 25 anos como correspondente internacional, cobrindo a América Latina, me deparei com uma saraivada de presidentes, ministros e todo tipo de políticos que tentam esquivar a imprensa. Eles temem (ou odeiam) que lhes façamos perguntas sobre corrupção, medidas arbitrárias ou estrambóticos projetos. Alguns falam. Mas arrancar uma declaração de muitos deles às vezes é uma tarefa de Hércules. Só encontrei um setor mais assustado do que os políticos para falar sobre um assunto que lhe incomoda. 

O grupo: os homens. 

O assunto: a andropausa.

Os problemas já começam quando – muito antes da andropausa – surge a palavra “próstata” nas conversas. Ou melhor, quando algum homem do círculo de amigos comenta que precisa fazer um exame de próstata. Imediatamente os outros começam a argumentar que “não é necessário, pois ainda é muito jovem” ou “isso é coisa para pessoas de mais de 70 anos”. 

Na realidade, a partir dos 40 anos de idade é imprescindível realizar um exame anual de próstata (e até diria que não custa nada começar antes. E, além do exame de sangue, de preferência – para ter mais certezas – o exame de toque retal. 

A mera alusão a este exame gera uma onda de pânico na maior parte dos homens. Eles consideram – segundo alguma lenda urbana – que passar por esse exame equivale à uma espécie de “defloração”. E muitos acreditam que um exame de toque retal implicaria na eliminação de sua masculinidade heterossexual. 

Sim, já consumimos 20% do século XXI, mas boa parte dos homens no Terceiro Mundo (área do planeta marcada pelo machismo) ainda pensa como no século XI…  

Tive uma pielonefrite aguda em 2006, quando tinha 40 anos. Uma infecção generalizada de rins, bexiga, uretra e próstata. E de lá para cá – todos os anos – faço todo tipo de exames de próstata, para fiscalizar como ela anda. Mas, comentar isso entre os amigos é como falar sobre um colossal tabu. Mas existe um cenário mais dramático: nas conversas com vários médicos (que são de outras áreas, mas não a urológica) também me relativizam a necessidade de exames rigosos da próstata. “Faz um exema de sangue, que é mais do que suficiente”, dizem. E depois, na contra-mão dos especialistas, arrematam “e não precisa ser todos os anos….”

Um absurdo. Seria como um homem que, no meio de uma pandemia, diga que não é necessária a obrigatoriedade de uma vacina. Imaginem uma loucura dessas. 

Mas, se “exame de próstata” é uma expressão tabu, a palavra “andropausa” geralmente não gera reações de temor ou de incômodo. Na maior parte das vezes não provoca nada. E aí vem o espantoso motivo: ela não gera reações negativas porque a maioria dos homens sequer ouviu falar dela. 

Isto é, de forma imediata ela gera a pergunta “Andropausa? O que é isso? O nome de uma ilha grega?” 

Quando explico do que se trata, de uma etapa análoga (análoga mas não igual) à menopausa, com queda da libido, revertérios hormonais, cansaço, variações no humor (entre muitos outros fatores), aí sim, provoca outra reação (desta vez, de rejeição): “ah, não, isso é coisa de octogenários!!!”                               

Não ajuda em nada a ilustração que acompanha o verbete “Andropausa” na Wikipédia em português, a imagem de um vovozinho de barbas brancas, em mode Matusalém, com jeitão senil. O clássico machismo latino. Uma espécie de mensagem consoladora (e nada realista) de “não se preocupe, isso só vai acontecer quando você já for bisavô”.

É verdade que o termo não colabora, pois “andropausa” é uma palavra que vem do grego, que junta as palavras “homem” e o verbo “cessar”. Soa dramático. Como se o homem deixasse de ser “homem”. E neste sentido, como se ele deixasse de ser o “macho man”, o “macho latino” (neste caso, para definir algo mais regional). Os franceses possuem mais sutileza, ou precisão técnica, ao chama-la de “Déficit androgénique lié à l’âge” (déficit androgênico ligado à idade), mais conhecido pela sigla “DALA”.

Não sei se dizer “estou em mode DALA” seria mais potável do que dizer “estou na andropausa”. Mas, é imprescindível falar sobre o assunto, seja lá qual for o nome a usar.

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