Com a passagem para o Bananendampfer nas mãos e o coração aos pulos, fui comprar as caixas de alumínio necessárias para encaixotar meus pertences, uma vez que caixas de papelão não eram permitidas a bordo e caixas de madeira eram muito pesadas. Escolhi comprar as caixas num vermelho sangue, achei que essa cor vibrante combinava com meu estado de espírito: estava muito excitada com o que estava por vir.
Contava para todo mundo que iria voltar para o Brasil, e de navio! “Que maravilha, diziam as pessoas, sempre sonhei em fazer uma viagem assim!” Eu já me imaginava naquele navio tipo Titanic, dançando num salão lindo, tomando sol na beira da piscina de um azul intenso, fazendo refeições no restaurante de bordo bacana, sentada às noites no balcão do bar saboreando um drinque gostoso em companhia de pessoas chiques.
E minha cabine, como seria? Eu tinha comprado a passagem para uma cabine de solteiro, pequena, mas com a certeza de que tivesse uma escotilha (janela, no linguajar náutico). Sabia que muitas vezes as cabines de preço mais acessível eram internas e sequer escotilha tinham. Portanto, ter uma janelinha seria puro luxo!
Uma odisseia foi conseguir a autorização necessária do Consulado Brasileiro para trazer minha bagagem. Tive que fazer uma listagem contendo cada coisa, por mais simples e banal que fosse. Tinha algumas páginas, já que tão detalhada, a lista.
Esta foi então datilografada por um funcionário do consulado em papel oficial da alfândega brasileira. Cada página carimbada e assinada, todas as páginas juntas por rebite e amarradas com um barbante nas cores verde e amarela, cujas pontas foram coladas com lacre de cera marcado a sinete com o emblema oficial brasileiro. Ufa! Para que tudo isso, você há de se perguntar.
Eram medidas de segurança da alfândega, tentando evitar, assim, a entrada de mercadoria ilegal ou sem o devido imposto de importação pago. Era impossível falsificar a tal lista. Até há pouco tempo eu ainda a guardava como recordação, mas numa das minhas últimas arrumações resolvi jogá-la fora. Pena, teria fotografado para você ver este documento tão exótico.
Fui levada ao porto pelos meus tios e minha prima, as caixas haviam sido despachadas pelos correios antes e já deveriam estar no bojo do navio. Eu levava comigo, além de muita ansiedade e curiosidade, apenas uma mala e minha frasqueira.
Achamos o cais de número 22, onde deveria estar ancorado o lindo navio que me levaria pelos mares afora. Eu procurava o navio, olhava em volta e antes que pudesse perguntar ao meu tio se estávamos realmente no cais correto, pude ler o nome daquele navio velho, enferrujado, pequeno e feio que estava ancorado bem à nossa frente: Heweliusz. E tive que conter minha decepção: aquele era o navio! Este era o nome que constava na passagem!
Após um segundo de transtorno, grito: “Que fantástico!” Não queria, de forma alguma, que meus tios percebessem a minha decepção. Ficariam tristes – afinal, foi muita ingenuidade minha, pensar que uma passagem com preço tão acessível fosse para um navio de luxo, um navio cruzeiro!
Ferrugem e sujeira por toda a parte! No convés, alguns homens trabalhando, carregando o navio com containers. Foi quando vi, no meio daqueles homens, um rapaz de cabelos compridos louros, usando um macacão sem camisa, mostrando seu corpo esbelto. Pensei: “Oh! Nem tudo está perdido, tomara que ele também seja um marinheiro.” Tirei fotos e paquerei bastante, antes de embarcar, enquanto tentava consolar minha tia, que chorava aos prantos.
Embarquei. E a primeira coisa que fiz foi tirar fotos da proa do navio, vista do pequeno convés reservado para nós, os poucos passageiros. Tive que tirar três fotos, torcer para que estivessem mais ou menos enquadradas de forma que pudesse montá-las depois de reveladas, para conseguir ter proa e mastros numa só imagem. Acho que nem ficou tão mal, veja a foto aqui. Coisas da fotografia antiga.
Hoje, fazemos num segundo uma foto panorâmica com nossos celulares e vemos logo o resultado, para decidir se deletamos ou salvamos. Devo lembrar que, quando tirávamos uma foto naquela época, só iríamos ver o resultado depois da revelação do filme, o que, muitas vezes, era decepcionante. Você chegou a conhecer tal situação?
Fui levada para a área destinada exclusivamente aos passageiros e recebi informações e instruções de como a vida a bordo seria: café da manhã, almoço e jantar tomaríamos no salão, que era o único lugar onde teríamos acesso, além das nossas cabines e do pequeno convés. Andar pelo navio era estritamente proibido.
Teríamos, a qualquer hora, acesso à geladeira, onde poderíamos nos servir de petiscos e bebidas não alcoólicas entre as refeições. Só então fiquei sabendo que o navio não tinha como porto final Santos, mas sim Montevideo, no Uruguai. E que, antes de chegarmos em Santos, aportaríamos em Angra dos Reis, onde seriam entregues alguns containers.
Três marinheiros estariam à nossa disposição, seriam nossos camareiros e garçons e somente a eles e ao capitão era permitido acesso ao convés destinado aos passageiros. Fiquei logo sabendo, após perguntar, que os homens que trabalhavam carregando o navio no porto de Hamburgo não eram marinheiros, mas sim funcionários do porto. “Que pena, aquele gato não está a bordo.” pensei.
A imagem externa do navio se repetiu no seu interior: mobiliar original dos anos 1950, onde se podia ver as marcas que o tempo deixa ao passar, afinal, estávamos em 1985. Minha cabine era pequena, com uma cama de solteiro muito estreita num quartinho minúsculo separado da salinha de estar por uma meia parede em fórmica e uma cortina velha. Para minha alegria, havia muitas janelas, que de tão grandes já não faziam jus ao nome de escotilha, pois estas eram quase sempre redondas e pequenas.
Tentando dar um toque pessoal naquele cômodo que seria meu lar por algumas semanas, pendurei, junto à cortina que separava o quarto de dormir da saleta, meu boá vermelho, que usara como decoração no meu apartamento. Na maçaneta da porta do armário de roupas amarrei meu lenço vermelho. Senti que um toque de cor faria bem à minha alma. Tentei retirar a toalha horrorosa que cobria a mesa, mas sem toalha era pior: A madeira do tampo da mesa estava toda rachada! O que eu naquela altura jamais pude imaginar: esta cabine seria palco de um amor muito picante!
O estilo da cabine se repetia no salão e nos outros passageiros, que eram bem mais velhos que eu e de aparência cansada. Sorri para mim mesmo, pensando no momento em que, antes de embarcar, me imaginei sentada junto às pessoas elegantes no lindo bar de bordo.
Móveis antigos e provavelmente já bem desgastados estavam cobertos com tecido e toalhas, na esperança de melhorar sua aparência. Cadê o luxo dos navios que eu via nas propagandas de viagem em cruzeiros? Não que eu esperasse tanto, mas aquilo…
Havia já aprendido na vida que, quando não podemos mudar uma situação, devemos fazer o melhor que pudermos dela. E foi o que fiz, me abri para os outros passageiros, ouvi suas histórias, contava das minhas dores, desejos e planos. Eu era a única jovem do grupo, além de um menino de seus 10 anos, e era tratada por todos com muito carinho.
No terceiro dia de viagem, um dos marinheiros que tinha a função de nosso garçom ficou doente e teve que ser substituído. Eis que um polonês alto, beirando os 30 anos, com uma barba espessa, corpo esbelto e muito gentil, passou a atender às mesas…
Se eu o menciono aqui, ele deve ter sido, de alguma forma, importante para mim, concorda? E foi mesmo! Mas nossos cinco minutos já se foram
e vou ter que pedir a você que contenha sua curiosidade até uma outra vez que me visitar aqui. Por favor, me conta nos comentários se ficou mesmo curiosa(o), adoro saber.
28 comentários
QueridA amiga estou ansiosa para o proximo capitulo!
Que bom! fico feliz em ver voce sempre aqui, me prestigiando. Obrigada, querida!
Aventura atraz de aventuras. Amo ler tudo.
Obrigada por estar sempre aqui, meu leitor fiel.
Nossa !!!estou amando suas aventuras?quero saber quanto tempo vc ficou no mar.
Fico muito feliz em ver que voce gosta de ler minha escrita, Lourdes. Obrigada!
Estou aqui curiosa com a história dentro do navio com este garçom , muito bom amiga.
Obrigada por estar sempre aqui, lendo minha escrita. Me faz feliz, amiga!
Simplesmente amooo
Ah! Obrigada, querida!
Já to iMaginando aS hIstórias de amor e diversão Nesse navio! AnsiOsa prá saber tudo! Bjos
JÁ estou batendo nas teclas do laptop. Daqui a pouco sai! Obrigada por me seguir aqui!
OTima narrativa!
FiWuei curiosa, quero saber a continuaÇão.
Obrigada, SYlvia. Logo tem a continuacao. Obrigada por me seguir aqui.
Uau ! Como sera o resto dessa viagem ? Esperando o PRÓXIMO capitulo !
Já estou escrevendo, Clau. Muito louquinha eu era… Era? Obrigada por me seguir aqui, leitora fiel.
Eu sonhava com uma viagem dessas, mas nunca fiz!
Quero saber mais sobre o polonês!
Vai saber já já, querida. E eu gostaria de fazer uma viagem como aquela que voce fez no amazonas, dormindo em redes no barco, lembra? Maravilha. Obrigada por me seguir aqui.
Ansioso para o próximo episódio.
Vem Já, jÁ, meu leitor fiel. Obrigada por me seguir aqui.
Curiosissima para saber o desenrolar da historia ❤️
Daqui a pouco vai saber tudinho, prometo. Um beijo e obrigada!
Estou amando e já quero saber como ficou esse polonês com essa garota linda!!
Voce vai saber, nao demora muito. Doideira… Obrigada por me seguir aqui, querida.
Sim! Quero saber!
Bjo ❤
E Vai saber, querida. Vai saber… obrigada por me acompanhar aqui!
um jeito de viajar que hoje já não existe mais.
vc embarca num ponto e não sabe o que te espera no destino.
adrenalina pura !!
aguardando o proximo !!
Ah! Na existe mais? Nao sabia! Que pena! Obrigada, querido!