O Saulo merece um episódio extra, acredite. Eu o conheci aos 18 anos (“Seduções na Cidade Maravilhosa”), em 1978, e ele fez parte da minha vida por quase dez anos. Imagine: se eu pudesse contar o tempo em que passamos realmente juntos, daria talvez alguns meses. E eu “gastei” tanta vida com um homem que só me fez sofrer, aceitando migalhas de atenção durante tanto tempo!

Mulher

Ele representava para mim tudo aquilo que sempre quis. Para começar, era bonito. Como era importante para mim este fato! Talvez eu tenha querido provar que poderia ter um homem lindo ao meu lado, para compensar minha feiura. Além disso, Saulo tinha muitos amigos, sendo eu sua namorada, teria como meus os seus amigos.

Para completar, ele tinha uma posição cobiçada e uma carreira promissora em uma agência de uma rede bancária importante, o que era a minha garantia de um lugar na sociedade de classe média alta no Brasil. Enfim, o homem perfeito, acreditava eu. Não media esforços para ganhar o seu amor.

Quando saíamos, geralmente no meio da semana, ele me pegava no portão de casa, íamos para um motel. Depois de saciar sua vontade do meu corpo, ele sumia por alguns dias. Eu cada vez mais apaixonada. Querendo ter aquele homem como meu namorado oficial custasse o que custasse. Como se tê-lo fosse a prova de que eu valesse alguma coisa. E os anos, a vida, passando, sem que eu me dedicasse aos homens que realmente se interessavam por mim, que não eram muitos, pois meu coração não estava livre.

Quando fui para a Europa, Saulo mostrou-se imensamente triste. Mesmo sabendo que eu trabalhava há anos no sentido de realizar este sonho, quando chegou mesmo a hora, passagem na mão, não queria que eu fosse! Tentou mesmo me impedir, dizendo que havia terminado o noivado e que iria me apresentar à sua família. Quase decidi mesmo não viajar, só não o fiz, pois havia já me comprometido com a minha tia na Alemanha e o contrato de trabalho já estava assinado. Não tive coragem.

Vivendo longe, escrevia cartas longas para ele, mandava fotos, jurava meu amor e jurava voltar para ele, que me esperasse. Os correios levavam na época duas semanas para enviar cartas intercontinentais. Telefonemas? Extremamente caros, só em caso de emergência. No início, Saulo respondera minhas cartas, o que foi ficando cada vez mais raro, com o passar do tempo. Até que, quando conheci o Wolfgang, (“O alemão do sobretudo marrom”), não só não senti mais falta de suas respostas, como não escrevi mais.

Agora, quase três anos depois, bem situada na agência de propaganda em Düsseldorf, chega uma carta do Saulo? Num momento em que eu estava me sentindo sozinha, o eterno problema de não ter amigos, tendo o namoro com o Michael ido para o brejo? Comecei a pensar na possibilidade de voltar para o Brasil. (“Nada é impossível, basta querer”)

Decidi tirar, o mais rápido possível, aquelas férias que já estavam há muito vencidas e ir ao Rio de Janeiro ao encontro do meu grande amor, que não me deixava em paz com cartas, cartas e mais cartas! Mesmo sem esperar minhas respostas, escrevia toda semana. Pensei: agora é meu!

Fiz uma listinha de tudo o que o Saulo, muito discretamente, pediu que eu levasse para ele: LPs do Pink Floyd e Dire Straits, conhaque Remy Martin, caneta – “se desse para ser uma da Montblanc, seria demais, minha querida, condiz com minha posição no banco. Comprei um apartamento para nós na Tijuca, novinho, acaba de ficar pronto, já estou morando lá, mas não tem nada ainda dentro, vamos ter que decorar bem bonito, que tal trazer uns quadros da Alemanha?”

Nem sei como pude colocar tudo aquilo dentro das malas. Mas consegui. As duas cópias de arte em posters numerados do Andy Warhol eu enrolei e coloquei em tubos de papelão. Mandaríamos fazer as molduras no Brasil.

Desembarquei em São Paulo, fui primeiro para a casa da minha mãe. Afinal, não queria que o Saulo me visse depois de uma noite mal-dormida no avião, cansada e suada. Passei uns dias em São Paulo e aproveitei para fazer uma embalagem bem original para a sua caneta Montblanc: soprei um balão e enfiei a caneta dentro, assim como confetes e serpentinas. Ficou lindo! Vesti o que achei ser minha roupa mais bonita para a ocasião e peguei a ponte aérea com destino ao aeroporto Santos Dumont.

Aterrissamos. Saulo veio ao meu encontro. Depois de alguns segundos que pareceram uma eternidade, ele me abraçou, me rodou no ar. Entreguei o balão com a caneta dentro, que ele disse iria abrir somente “na nossa casa”. Seguimos para o apartamento, onde ele me mostrara tudo… Estava felicíssima.

Neste capítulo, vamos saber da história de Saulo, a visita ao Brasil, a volta a a Alemanha e mais uma decepção dessa mulher tão competente.

Desfiz minha mala, entreguei os presentes, Saulo abriu logo a garrafa de conhaque, embora fosse ainda cedo, à tarde. Era verão, estava muito quente. Com a imaginação que Deus me deu, fiz um cantinho aconchegante no terracinho fresco do apartamento minúsculo que seria o nosso, estendendo uma canga sobre o chão e jogando por cima algumas almofadas que cobriam o sofá velho herdado da sua mãe.

Tomamos –melhor: Saulo tomou- a garrafa de conhaque inteira naquela tarde, enquanto fazíamos amor sobre a canga e almofadas. E tive a minha primeira experiencia com maconha: Saulo havia providenciado alguma erva para comemorar minha chegada. Enrolou um cigarrinho, eu dei uns tragos, meus primeiros. Desmaiei. Dormi como uma pedra por horas! Que vergonha eu senti ao acordar…

No dia seguinte fomos ao batizado de um sobrinho de Saulo e conheci toda a família. Foram gentis, nada mais, nada menos. Pareciam não me levar a sério. “Ah! Então você é a Susanne! Saulo falou de você…”

Eu estava feliz, mas sentia uma desarmonia no ar. Saulo andava desanimado, cabisbaixo, irritado. Eu contava uma semana que estava vivendo com ele, quando após o café da manhã tomado no tal terracinho, tipo piquenique, ele me confessou que percebera que definitivamente não era eu, e nunca haveria de ser, a mulher da vida dele. Mais uma vez, caíra o meu mundo!

Algumas horas mais tarde, estava eu sozinha no aeroporto Santos Dumont, olhos inchados de tanto chorar, esperando a ponte aérea que me levaria de volta para o colo da minha mãe, em São Paulo. Naquela altura, eu só queria uma coisa: morrer.

Mas eu não morri. Voltei para a Alemanha, para a agência de propaganda, para o meu apartamento, para a minha solidão. Com o amor-próprio mais baixo do que nunca. Sem saber o que fazer da minha vida, completamente sem plano. Era um fantasma, funcionando. Com sucesso na profissão e um coração despedaçado.

E quis a vida que aparecesse na agência a Myriam, de dezenove anos, uma estudante, que faria um estágio lá…

Mas sobre a Myriam eu vou contar de uma próxima vez. Interessante como algumas pessoas aparecem na nossa vida bem na hora certa! Já aconteceu com você, com certeza. Espero você aqui para ler sobre ela. E agradeço seu comentário ali embaixo ou no meu perfil do Instagram. Gostou de “me ler”?

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26 comentários
  1. Homens como o saulo existem Aos montes! Não seria dificil imaginar seu interesse… estou sempre curiosa com o proximo cApItulo! BEijos amiga!

  2. Saulo é do tipo que usa a beleza que tem para conseguir o que quer.
    Mas assim como tem pessoas menos boas, existem pessoas otimas, e essas marcam mais.

  3. Querida Susanne, que romance delicado . Acho que todas Em ALGUM momento passamos por essas experiências DOLOROSAS, mas que nos ensinam muito . Saulo era um don Juan rsrsr ? odiei esse don Juan hum

  4. Sempre “aparece alguem” nas situações mais diversas, e difíceis também!
    Quem não teve um “saulo” na vida?
    Já estou curiosa pra saber o que aconteceu.
    Bjs

    1. VOcÊ tambÉm? Fiquei curiosa! Mas saiba que o caso com o saulo nao terminou aqui… vai ver… obrigada por “me ler”.

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